Ilha de Calor Urbana em São Paulo: Como a Falta de Verde Aquece Sua Cidade em Mais de 8°C

As cidades são ambientes complexos que, por meio de sua expansão e da substituição de superfícies naturais por materiais artificiais, acabam criando seus próprios climas locais. Este processo de desenvolvimento urbano, aliado à emissão de gases e material particulado na atmosfera, é um fator determinante para a formação do que conhecemos como Ilha de Calor Urbana (ICU). Em São Paulo, uma metrópole com mais de 11 milhões de habitantes, a ICU não é apenas um incômodo térmico; é um fator que agrava a vulnerabilidade socioeconômica e ambiental, com sérias implicações para a saúde pública. Estudos anteriores já apontaram que um aumento de apenas 1 °C na temperatura média corresponde a um aumento de 3,46% na mortalidade geral. Mas, o que realmente determina onde o calor é mais intenso em São Paulo?

Entendendo a Metodologia: O Olhar do Satélite sobre o Calor

Para mapear e entender a distribuição da Ilha de Calor Urbana em São Paulo, o estudo analisou a relação espacial entre a temperatura da superfície e os padrões de uso e cobertura do solo.

Como o Estudo Mediu o Calor?

Em vez de depender apenas de estações meteorológicas fixas, que muitas vezes não refletem a heterogeneidade da malha urbana, os pesquisadores utilizaram imagens de satélite (Landsat 5) para estimar a Temperatura da Superfície (Ts). Esta técnica é a melhor opção para avaliar espacialmente as temperaturas em grandes áreas.

Para quantificar o fenômeno, o estudo calculou o Delta de Temperatura (\Delta T), que é a diferença entre a temperatura dos centros urbanos e a de seus arredores rurais. O distrito não urbano de Parelheiros, no extremo sul, foi usado como referência para a área rural.

A partir dessas medições, a classificação térmica foi simplificada em três categorias, visando facilitar a identificação das relações espaciais no vasto território de 1.521 km² do município:

1. Ilha de Calor Forte: ΔT superior a 8∘C.

2. Ilha de Calor Moderado: ΔT entre 5∘C e 7∘C.

3. Ilha de Frescor: ΔT inferior a 4∘C.

A Relação Cruel: Concreto, Falta de Vegetação e Calor Extremo

Os resultados mostraram uma forte correlação entre a presença de superfícies artificiais, a escassez de vegetação e a intensidade do calor.

Fonte: Barros & Lombardo, 2016.

Ilhas de Calor Forte: Onde o Concreto Domina

Os ambientes que apresentaram a maior intensidade do fenômeno da ilha de calor (diferenças de temperatura superiores a 8 °C) foram aqueles com quase ou total ausência de biomassa vegetal. Nesses locais, o Índice de Área Foliar (IAF) medido ficou entre 0,0 e 0,019.

O uso do solo predominante nas áreas de ICU forte (Eixos 1, 2, 3 e 5) foi o de:

Armazéns/Indústria, Comércio e Serviços.

Residencial horizontal de baixo, médio e alto padrão sem vegetação.

A abundância de asfalto, concreto e telhados de zinco, amianto e alumínio nestes ambientes aumenta a propagação e o armazenamento de calor, resultando na drástica diferença de temperatura. Exemplos de distritos em eixos de ICU Forte incluem Brás, Cambuci, Mooca, Santo Amaro e Capão Redondo.

Ilhas de Frescor: Oásis de Alívio Térmico

Em contraste, as áreas classificadas como Ilha de Frescor Urbana formam “oásis térmicos” em meio à mancha urbana aquecida. Estes locais apresentaram temperaturas da superfície muito próximas às áreas rurais (variação de apenas 0 a 4 °C).

Essa diferença positiva está diretamente relacionada à elevada concentração de vegetação. A análise da cobertura do solo mostrou que as ilhas de frescor estão espacialmente relacionadas às áreas urbanas vegetadas, onde o Índice de Área Foliar (IAF) foi significativamente mais elevado, variando entre 0,24 e 0,66.

Os padrões de uso do solo mais comuns nesses oásis são o residencial vertical de alto/médio padrão e as áreas de residencial/comércio e serviços que mantêm altos índices de vegetação. Distritos como Jardim Paulista, Pinheiros, Consolação e Morumbi formam o principal núcleo de ilha de frescor.

Pontos-Chave e Curiosidades sobre a ICU em São Paulo

Impacto na Saúde: Para cada 1 °C que a temperatura média aumenta em São Paulo, a mortalidade geral cresce 3,46%.

Diferença Extrema: A variação total do gradiente de temperatura da superfície medido no município foi superior a 10 °C, indo de mínimos de 17 °C (áreas verdes) a máximas superiores a 27 °C (áreas de forte calor).

A Causa Principal: A baixa ou total ausência de vegetação foi apontada como a principal responsável pela intensidade e distribuição espacial da Ilha de Calor Urbana.

A Importância das Áreas Naturais: Os menores valores de temperatura estavam concentrados nos limites extraurbanos e em áreas de preservação, como a Serra da Cantareira e o Parque do Carmo.

A Solução Verde: Mesmo em áreas urbanas condensadas, distritos com altos índices de biomassa vegetal apresentam características de ilhas de frescor.

Conclusão: O Futuro Térmico da Cidade

Os resultados deste estudo são claros: o fenômeno da Ilha de Calor Urbana em São Paulo é severo e diretamente determinado pela falta de vegetação e pelo tipo de ocupação do solo, como armazéns e indústrias, que utilizam materiais que absorvem e retêm muito calor.

O estudo ressalta a urgência de preservar parques e unidades de conservação, que são essenciais para amenizar as temperaturas. Além disso, a expansão da cobertura vegetal urbana é vista como uma necessidade crucial para diminuir a intensidade do fenômeno. A forma como planejamos nossas cidades – priorizando o concreto ou o verde – tem um impacto direto e mensurável na nossa saúde e qualidade de vida.

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